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Sarado ou transtornado ?

                                                                                  


  A sociedade contemporânea, apesar de ter à disposição tantos progressos tecnológicos, conquistas científicas notáveis e diversos estudos sobre os aspectos psicológicos referentes à qualidade de vida, parece sofrer de uma anemia profunda naquilo que se trata do que os antigos chamavam de sabedoria de vidaA sabedoria de vida significa saber ponderar o valor de cada acontecimento. Pondus, em latim, significa peso; ponderar é saber dar a cada acontecimento o peso devido. ( a foto acima tem como fonte o site www.whiteoaksresort.com)   
 O equilíbrio emocional é, sem dúvida, uma das conquistas mais importantes da pessoa humana. Traz  ao indivíduo, uma grande capacidade de organizar-se interiormente e de saber priorizar o que é mais importante tanto em circunstâncias favoráveis como em situações desfavoráveis. A palavra equilíbrio é composta pelo adjetivo latino aequus, igual, equitativo, e libra, balança; portanto significa: nível igual das balanças.
Equilíbrio foi o que demonstrou ter a alemã Joahann Quass, de 91 anos
fonte : www.avantaje.ro

  Essa ausência sistemática da análise reflexiva, ou seja, do saber refletir, ponderar e tomar decisões inteligentes, leva as pessoas a uma constante desorganização mental e afetiva. Isso pode causar desequilíbrio: exagerar na concepção de alguns conceitos, temer desmedidamente que alguma coisa de ruim aconteça, transformar em neurose aquilo que deveria ser fonte de descontração  e assim por diante.
  A falta de ponderação e equilíbrio pode atingir também a concepção que uma pessoa tem de sua própria imagem corporal, o que pode gerar frustração  e resultar em ações que podem colocar a saúde dessa pessoa em risco. O artigo "Concepções da imagem corporal entre praticantes e instrutores de musculação, fisiculturistas e estudantes de educação física da região metropolitana de Salvador-Bahia: uma análise sobre os níveis de satisfação com a forma física e a autopercepção corporal" pode nos ajudar a discernir entre o que pode ser um bem para a saúde e o que pode ser um perigo para a mesma. Os autores são: Ana Cristina Rodrigues Mendes, nutricionista e educadora física, doutora em Psicologia, Saúde, Educação e Qualidade de Vida pela American World University, Latin American Department (AWU-LAD), docente da Universidade Estadual da Bahia; Helio José Bastos de Carneiro Campos, educador físico, doutor em Educação pela Universidade Federal da Bahia, livre docente pela AWU-EUA e Ana Luíza Coelho Rubini, psicóloga, mestre em Desenvolvimento Humano e Responsabilidade Social pela Fundação Visconde de Cairu.
   Os autores comentam que "nas últimas décadas, o tema imagem corporal vem despertando um interesse cada vez maior no Brasil e em diversos países, especialmente entre adolescentes e jovens, uma vez que comumente estes indivíduos associam a sua identidade à autoimagem corporal. O conceito de imagem corporal não necessariamente representa o reflexo do espelho, como ressalta Courtine (1995): “[...] ter uma boa aparência não significa ter uma imagem corporal positiva; a imagem corporal é, na verdade, um estado de espírito”. 
                                                                              
Praticar exercícios físicos deve ser fonte de descontração ainda que exija disciplina
fonte: primofitnessusa.com

   Segundo especialistas, "a busca de uma imagem corporal adequada aos anseios estereotipados de corpo é um dos fenômenos mais impressionantes na sociedade atual, existindo neste contexto, uma grande influência cultural sobre a imagem do corpo, o que pode criar aspectos distorcidos relacionados ao universo corporal. A crescente valorização do corpo e da estética nas sociedades de consumo, refletida nos meios de comunicação de massa, que expõem como modelo ideal e de masculinidade – um corpo inflado de músculos – pode estar contribuindo para que um número crescente de jovens envolva-se com o uso de esteróides anabolizantes, dentre outras práticas arriscadas, na intenção de rapidamente desenvolver massa muscular. "
                                                                      
Na prática esportiva, há metas mais elevadas do que ter corpo sarado. Waldemar Niclevicz,primeiro brasileiro a escalar o Everest fonte: www.jornaldooeste.com.br
 "A autopercepção do peso é um aspecto importante quando se fala de imagem corporal, podendo ser influenciada por diversos fatores, incluindo a cultura e os padrões sociais.  Os estudiosos da área  afirmam que a autoavaliação da imagem corporal pode ocorrer de três formas:  o indivíduo pensa em extremos relacionados à sua aparência ou é muito crítico em relação a ela; o indivíduo compara a aparência com padrões extremos da sociedade; e o indivíduo concentra-se em um aspecto de sua aparência. A enfática estratégia do estímulo à prática de exercícios físicos e da alimentação visando o rendimento e as medidas corporais, e o incansável desejo de ter um corpo adequado aos padrões culturalmente impostos, reforçam as analogias que comumente são feitas entre o corpo humano em movimento ao padrão de uma máquina, nas quais ambos – exercício e alimentação – são executados de um modo irrefletido e irresponsável, repetitivo e mecânico."
                                                                                 
O exercício físico faz bem se dá mais saúde, faz mal se leva à neurose
fonte: greatist.com
  Alguns estudiosos " realizaram uma revisão sobre aspectos relacionados à imagem corporal em indivíduos do sexo masculino. Em termos gerais, o estudo aponta que alterações de imagem corporal no sexo masculino, ao contrário do que se pensava, são considerados relativamente comuns, e diferem do padrão de distorção tipicamente feminino. As mulheres apresentam níveis bem maiores de insatisfação que os homens e descrevem sempre corpos mais magros como objetivo. No caso dos homens, há aqueles que seguem o padrão feminino, mas a maioria considera um corpo mais musculoso como representação da imagem corporal masculina ideal. Sabe-se hoje que o excesso de vaidade e a obsessão para manter um corpo escultural não são características exclusivas das mulheres, tendo-se revelado frequentemente entre os homens, que estão cada vez mais preocupados com a aparência. Entretanto, o que inicialmente parecia ser um cuidado com a saúde corporal vem se transformando em problema, que tende a agravar-se quando a busca pela perfeição extrapola os limites do corpo, originando um transtorno psíquico conhecido como transtorno dismórfico muscular. Se a imagem culturalmente dominante e socialmente valorizada remete ao estereótipo do sujeito forte e musculoso, esta provavelmente tornar-se-á a busca incessante de muitos insatisfeitos com o próprio corpo. Aqueles que não conseguem alcançar esse padrão desejado, podem desencadear um processo de sofrimento patológico que passa a exercer um impacto negativo sobre a autoimagem e sobre a vida do sujeito, interferindo nas suas relações, no seu comportamento social e afetivo... esta imagem corporal negativa pode determinar o aparecimento de baixa autoestima e depressão, ou seja, sofrimento”. 
                                                                            
As mulheres também devem procurar o equilíbrio na prática esportiva
fonte: br.pinterest.com  
   O artigo cita que, em pesquisa que tentou avaliar o tipo físico ideal e o nível de insatisfação com a imagem corporal entre 186 praticantes de caminhada, sendo 87 mulheres e 98 homens, verificou-se que as mulheres tendem a escolher silhuetas menores que a atual; no caso dos homens, a tendência é desejar desenvolver um corpo com maior massa muscular e menor quantidade de gordura corporal, o que demonstra diferentes expectativas em relação ao corpo entre os sexos.  A preocupação com a imagem corporal parece ser uma marca feminina, sobretudo na adolescência, quando o corpo estabelece seu formato. Os autores afirmam que os garotos adolescentes não sofrem tanta pressão social, tendendo a apresentar melhor aceitação da sua autoimagem." No entanto, contrariamente ao que afirmam tais pesquisadores, os resultados deste estudo, e os autores referem-se aqui aos resultados obtidos no estudo que resultou no artigo de que tratamos nessa postagem, revelam um elevado índice de insatisfação dos entrevistados, todos do sexo masculino, com a sua imagem corporal, particularmente aqueles mais jovens. Esses achados são semelhantes aos de outros estudos relatados na literatura científica, reafirmando que a pressão social, fatores ambientais, socioculturais, dentre outros já referidos anteriormente, afetam de modo significativo os indivíduos de ambos os sexos, embora este estudo não tenha envolvido indivíduos do sexo feminino. "
                                                                                
O desequilíbrio na prática esportiva pode ser fatal
fonte : escola.britannica.com.br
 "Entre os praticantes de musculação foi possível verificar elevado grau de insatisfação com respeito à imagem corporal nas diversas faixas etárias. Entre os mais jovens (de 18 a 24 anos), aproximadamente 60% estão insatisfeitos (40,6% gostariam de ser mais fortes ou mais gordos e 19,8% mais magros); entre 25 e 29 anos, cerca de 50% estão insatisfeitos, com percentuais similares entre as duas categorias. Os praticantes de musculação com idade entre 30 e 35 anos e os mais velhos (41-45 anos) foram os que apresentaram os maiores percentuais de insatisfação quanto ao fato de serem mais magros (50% e 46,7%, respectivamente). "
                                                                                   
O instrutor de academia não precisa ser um modelo fotográfico; precisa  conhecer e transmitir os conceitos sobre exercícios
fonte :www.energiefitness.co.uk

  O autores apontam que , um "estudo realizado por um pesquisador chamado Antunes (2000) revelou que o número de instrutores de musculação é crescente até 30 anos, e de 30 a 35 anos ocorre frequentemente uma diminuição na quantidade de instrutores em atividade. Esses dados apontam para uma valorização da condição física e aspecto jovial para esse mercado de trabalho, o que reforça as evidências de que existe ênfase exagerada na aparência física, principalmente no ambiente das academias, que é muito influenciado pela mídia e pelo culto ao corpo em nossa sociedade."

 " Com base na análise descritiva e exploratória dos dados e discussão dos resultados da pesquisa, pode-se afirmar ainda que mais da metade dos indivíduos pesquisados revelam estar insatisfeitos com a sua imagem corporal... Cabe destacar que vários aspectos relacionados à identidade, gênero, relações de poder e autoafirmação do sujeito em relação à sua imagem corporal que não foram alvo de investigação deste estudo, devem ser considerados na análise do perfil dos grupos de risco para o desenvolvimento de transtornos de autoimagem em estudos posteriores. Vale ressaltar ainda a necessidade de pesquisas direcionadas ao estudo da imagem corporal e suas distorções. Isto se realizaria no sentido de  propor ações educativas e preventivas aos transtornos corporais e intervenções de caráter multiprofissional que possam contribuir para o controle e diminuição nas estatísticas ligadas a estes distúrbios psíquicos e emocionais. Estes que, por sua vez, estão intimamente associados a um estilo de vida pautado na cultura do exagero e do imediatismo que vigora na sociedade atual, e particularmente associados a uma busca desenfreada e ilimitada de um padrão ou um ideal de perfeição inalcançável.  "
                                                                               
Com cinco medalhas olímpicas, Robert Scheidt sempre buscou  o equilíbrio e deseja que o superem
fonte: esportes.estadão.com.br 

   É uma pena que a prática de exercícios físicos, que em si pode ser uma atividade tão saudável, possa vir a ser, por falta de ponderação, causa de desequilíbrio mental e físico. É importante então,  buscar uma reflexão contínua sobre o que nos leva ao desequilíbrio nesse aspecto. Se for o imediatismo, como apontaram os autores do artigo, é preciso avaliar que é a constância na prática esportiva que nos permitirá ter bons resultados quanto ao condicionamento e desenvolvimento muscular. Se for a busca de uma imagem física idealizada em nossa cabeça mas que não corresponde à realidade do biotipo físico a que pertencemos, é melhor parar um pouco, refletir bem e perceber que isso é uma bobagem. Não iremos conseguir chegar nesse ponto porque é irreal : poderemos, provavelmente, minar a própria saúde física e psicológica e jogar no fundo do mar a felicidade que tanto buscávamos.

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